Líder do processo que construiu maioria para a aprovação da reforma da Previdência na Câmara, o presidente da Casa, Rodrigo Maia, afirmou ao Valor ter divergência em relação à proposta de reforma tributária que o ministro da Economia, Paulo Guedes, deverá apresentar nesta semana.
Questionado sobre a ideia da equipe econômica de reduzir ou eliminar as deduções de gastos com saúde e educação no Imposto de Renda, Maia disse que alterações como essa não estão no escopo do que defende. "Não tem nada a ver com nossa proposta. Não estamos tratando da renda. Se quiser discutir a renda, podemos discutir. Nosso foco são os impostos que têm relação com bens e serviços. Se ele vai discutir renda, vamos ver que proposta ele vai encaminhar", disse Maia à reportagem, na sexta-feira, enquanto era requisitado para selfies por dezenas de correligionários que o ovacionaram ao fim de uma reunião do DEM fluminense, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. O presidente da Câmara disse que vai esperar o anúncio da proposta definitiva de Guedes para pedir uma avaliação da área técnica de modo a tomar "uma posição mais organizada sobre o assunto".
Durante o discurso aos partidários - que celebravam a filiação de prefeitos que irão disputar a eleição municipal de 2020- Maia destacou a importância do Legislativo, numa afirmação do papel que vem desempenhando como contrapeso aos excessos do Executivo e de Jair Bolsonaro. Disse que, nos últimos 30 anos, o Executivo comandou o Legislativo, "tomando o nosso poder". "O presidencialismo de coalizão, de alguma forma, também tirou as prerrogativas do Legislativo. Os deputados e senadores, quando eram nomeados ministros, a primeira coisa que eles faziam era editar uma medida provisória. A medida provisória é o instrumento mais autoritário que tem porque tem poder de lei antes do povo decidir e da Federação decidir, que são a Câmara e o Senado", disse.
Maia ponderou que sua afirmação na véspera, de que "Bolsonaro é resultado dos nossos erros", não foi uma crítica ao presidente. Mas uma constatação dos equívocos da classe política que levaram à eleição do ex-deputado, cujo resultado se definiu, em sua opinião, com a facada que o então candidato levou durante a campanha. "Mas, claro, se [ele]editou uma medida provisória inconstitucional, o Supremo derruba. Se editou um decreto inconstitucional, o Congresso derruba. A democracia é assim",disse.
Sobre a edição da medida provisória que desobriga as sociedades anônimas de publicar seus balanços em jornais de grande circulação, Maia afirmou que vai discutir o assunto nesta semana na Câmara, mas voltou a demonstrar sua contrariedade à MP. "Já disse que tudo que desorganiza um sistema da noite para o dia não é bom. Os jornais escritos têm uma importância grande, por todas as regiões do Brasil. A gente não pode gerar um impacto da noite para o dia e acabar com todos os jornais", disse. Ao editar a MP, Bolsonaro assumiu que a medida foi feita como retaliação e vingança à cobertura de sua candidatura, embora diga ser favorável à liberdade de imprensa.
Para Maia, os arroubos de Bolsonaro devem ser combatidos com ações e até silêncio, e menos com o enfrentamento diário. "Se perguntar,você concorda com tudo o que ele fala? Não. Mas não acho que o melhor método é ficar toda hora enfrentando, criticando. É com ações, reafirmando a força do Parlamento, a importância do sistema democrático, que a gente vai dar as respostas", disse. O presidente da Câmara afirmou que "não vale essa questão de ficar toda hora: 'ah, ele está errado'". "Eu fiz isso no início. Acho que chegou um momento que eu acho que já está bom. Agora a gente tem uma pauta que, quando a gente acha que tem alguma coisa errada, ou a gente vai reagir com força ou a gente vai reagir com o nosso silêncio. O nosso silêncio também é uma resposta forte muitas vezes", afirmou.
Sobre a polêmica indicação do filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para a embaixada do Brasil em Washington,Maia parece preferir essa saída e silencia: "Não vou interferir numa decisão que não passa pela Câmara". Questionado se Bolsonaro não deveria governar para todos, em vez de fazer uma constante sinalização política para o núcleo mais radical de seu eleitorado, o parlamentar argumentou que "uma coisa é a vocalização, outra é a execução". "Ele vocaliza para os núcleos que considera que foram decisivos para a vitória dele, o que é correto também, mas no diálogo, na política, ele tem avançado, o governo tem melhorado sua interlocução com o Parlamento."
Outro nível de governo com que Maia está inclinado a manter boas relações é o estadual. Na reunião partidária, ainda não se sabia o resultado de uma possível aliança com o governador Wilson Witzel. O presidente da Câmara afirmou que a tendência é essa, o que, segundo seu pai, o vereador Cesar Maia(DEM), resultaria em espaço para o partido no primeiro escalão. "Queremos ajudar o governo estadual, para tratar de temas decisivos do nosso Estado. O caminho é esse, de aliança estadual, claro que tem um impacto nas eleições municipais."