Conforme já era esperado ontem o Banco Central reduziu a taxa Selic em mais 0,50% para 5,50% ao ano, que se torna a nova mínima histórica da taxa base de juros brasileira. No entanto, o que o mercado não antecipava era que a instituição viria com um discurso mais “dovish”, que passa a mensagem de maior inclinação em continuar o ciclo de cortes de juros além do que já era esperado pelo mercado. Com esta sinalização, as instituições financeiras começaram a revisar seus cenários de taxa Selic para patamares abaixo dos 5,00% ainda neste ano, devido ao modelos do Banco Central apontarem que mesmo com o câmbio se mantendo estável acima dos R$ 4,00 por dólar, as projeções de inflação não apresentaram nenhum mudança. Para o investidor, um cenário de juros mais baixo trás junto um menor retorno da renda fixa tradicional atrelada ao percentual do CDI, fazendo com que seja cada vez mais importante a busca por bons investimentos que ofereçam a possibilidade de melhores retornos com riscos controlados para o longo prazo. O resultado deste cenário com juros mais baixos por um período prolongado, já vem sendo observado no crescimento da demanda dos investidores por opções de investimentos em renda variável e multimercado.
Todos os economistas consultados veem espaço para o juro cair para um nível entre 4,5% e 4,75% no fim deste ano
Por Juliana Machado, Lucinda Pinto e Sergio Tauhata — De São Paulo 19/09/2019 05h00
O cenário surpreendentemente confortável para a inflação neste e no próximo ano, traçado pelo Comitê de Política Monetária (Copom), deve dar força à visão de que a taxa Selic poderá cair abaixo dos 5% ainda este ano. As projeções apresentadas no comunicado, divulgado após a decisão do comitê de reduzir a Selic para 5,5% ao ano, mostram que, mesmo com a recente disparada do dólar para cima dos R$ 4, as projeções para o IPCA se afastaram ainda mais da meta para o próximo ano, de 4%. E, portanto, o espaço para cortes adicionais é ainda maior.
Todos os economistas consultados veem espaço para o juro cair para um nível entre 4,5% e 4,75% no fim deste ano. Mas já há quem considere que, a depender da evolução do câmbio, a taxa possa ficar ainda mais baixa, em 4%. Esse é o caso do economista-chefe da Garde Asset Management, Daniel Weeks, para quem os cenários apresentados pelo comunicado agora estão muito mais realistas. E confirmam que o modelo do BC “aguenta um dólar acima de R$ 4”. Mesmo o reajuste dos combustíveis, confirmado ontem à noite pela Petrobras, deve ter efeito limitado sobre a inflação. “Temos folga”, diz. Caso o dólar caia para perto dos R$ 3,90, estimativa do mercado captada pela pesquisa Focus, então o juro pode cair ainda mais, para 4%.
No cenário de câmbio e juros constantes, a projeção para o IPCA em 2019 caiu de 3,6% para 3,4% e, em 2020, permaneceu em 3,6%. Mas a grande novidade do comunicado do Copom foi a volta do cenário híbrido, no qual os integrantes do BC usam uma taxa de câmbio no patamar da semana passada, mas com a projeção de juros do mercado para o fim do ano, tirada da pesquisa Focus. Nesse modelo, com um câmbio de R$ 4,05 e Selic em 5% ao ano, a inflação em 2020 ficaria abaixo da meta, em 3,8%.
“Ou seja, mesmo com a valorização recente do dólar há espaço para mais cortes sem que haja comprometimento da convergência de inflação para a meta. Essa é a grande mensagem do comunicado”, diz Jankiel Santos, economista do Santander. O banco também trabalha com uma estimativa de Selic em 4,5% no fim deste ano e estabilidade da taxa ao longo de 2020. Para Santos, o BC parece mais preocupado com o cenário externo agora. “Isso vem na esteira de uma desaceleração de crescimento global mais intensa. No momento, o cenário é relativamente favorável aos emergentes, na visão do BC, mas se houver uma piora grande o risco é isso se refletir na taxa de câmbio e reforçar a aversão ao risco com aumento de prêmios.”
Esse quadro mais favorável apresentado pelo comitê levou o Citi a revisar, de 5% para 4,5%, sua estimativa para a Selic no fim deste ano. Da mesma forma, as consultorias Tendências e Rosenberg devem alterar sua projeção para o juro baixo de 5% - que até aqui era o cenário base. No caso da Rosenberg, essa alteração deve se consolidar após a divulgação do Relatório de Inflação relativo ao terceiro trimestre, no fim deste mês. Além da melhora das perspectivas de inflação, a economista da Rosenberg, Thais Zara, chama a atenção para o fato de o BC classificar o cenário externo como desinflacionário para o Brasil. “Junto com as projeções isso sugere que o BC vê espaço para uma redução adicional da Selic, abaixo dos 5% da pesquisa Focus.”
“Fomos surpreendidos pelos cenários do Copom porque esperamos inflação maiores para 2020, perto de 3,7%, já contando com a fraqueza da atividade. No cenário de juro e câmbio constante do Copom, a inflação se mantém na meta, então isso deixa claro que existe espaço para reduzir o juro ainda mais”, afirma o economista Luis Bento, da Rio Bravo. “O BC tem espaço para cortar para 4,75% ou menos, a depender dos dados de inflação.” Bento afirma que o BC pode prorrogar para a primeira reunião do ano que vem um eventual corte de 0,25 ponto, mas “certamente a Selic encontra espaço hoje para ficar abaixo dos 5%”, de maneira que os mercados, sobretudo o de juros futuros, devem registrar ajustes hoje logo cedo.