Itens que reagem mais ao ritmo da atividade econômica continuam extremamente comportados
Por Sergio Lamucci — De São Paulo 22/11/2019
A inflação ao consumidor segue em níveis baixos, refletindo em boa parte uma demanda fraca, ainda que a economia tenha dado sinais de recuperação um pouco mais firmes nos últimos meses. Itens que reagem mais ao ritmo da atividade econômica continuam extremamente comportados, como fica claro pelo resultado do núcleo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) que reúne serviços, alimentos e bens industriais mais sensíveis ao ciclo econômico.
Conhecido como IPCA EX2, esse núcleo está em alta de apenas 2,4% nos 12 meses até outubro, abaixo dos 2,75% do piso da banda de tolerância da meta deste ano. As cotações dos produtos industriais também mostram o efeito da fraqueza da economia. Em 12 meses, sobem apenas 1%. O grupo desses bens inclui artigos de higiene pessoal, de limpeza e vestuário, além de itens como automóveis, eletroeletrônicos e eletrodomésticos.
A grande ociosidade na economia, evidenciada pelos níveis ainda muito altos de desemprego, contribui para segurar os preços, devendo levar o IPCA a fechar pelo terceiro ano seguido abaixo da meta perseguida pelo Banco Central (BC), de 4,25% em 2019. As previsões do mercado apontam para um indicador na casa de 3,3% neste ano. Nos 12 meses até outubro, a alta é de 2,54%, mas haverá uma alta nessa base de comparação em novembro e dezembro, segundo as previsões dos analistas. Para 2020, a expectativa que aparece no Boletim Focus do BC é de um IPCA de 3,6%, também inferior ao alvo do ano que vem, de 4%.
No terceiro trimestre, a taxa de desemprego ficou em 11,8%, o equivalente a 12,5 milhões de pessoas. Além da desocupação elevada, grande parte das vagas tem surgido no setor informal. São empregos de pior qualidade, que deixam o consumidor menos confiante para gastar.
A economista Basiliki Litvac, da MCM Consultores, diz que alguns núcleos em níveis muito baixos refletem justamente a demanda ainda fraca. “É uma economia que ainda não ganhou mais tração”, afirma ela. “Isso segura uma série de preços.”
Basiliki cita como exemplo o núcleo IPCA EX3, que inclui apenas os serviços e bens industriais que mais reagem à atividade, diferindo do IPCA EX2 por não englobar alimentos. Nos 12 meses até outubro, o IPCA EX3 está em alta de 2,7%. Para ela, o IPCA deve fechar 2019 entre 3,3% e 3,4%, encerrando 2020 em 3,5%.
O economista Márcio Milan, da Tendências Consultoria, ressalta que a inflação segue comportada mesmo com o câmbio mais pressionado - e por um período relevante. Desde o começo de fevereiro, o dólar subiu 14,5%, oscilando na casa de R$ 4 nos últimos três meses. O ponto é que a demanda fraca dificulta o repasse da desvalorização do real e de eventuais aumentos de custos para o preço final, diz ele.
Basiliki e Milan apontam ainda outros dois fatores que contribuem para a inflação continuar baixa. Segundo eles, uma ajuda importante a conter os preços tem sido a inércia, o fenômeno pelo qual a inflação passada alimenta a futura. Com o IPCA abaixo da meta desde 2017, indicadores modestos de um ano colaboram para que os índices se mantenham baixos no ano seguinte.
Outro aspecto é o comportamento das expectativas de inflação, dizem os dois economistas. As projeções dos analistas para a inflação de 2019 e 2020 estão abaixo das metas perseguidas pelo BC, de 4,25% e 4%, e exatamente nos alvos de 2021 e 2022, de 3,75% e 3,5%, segundo o Boletim Focus. Expectativas sob controle facilitam o cumprimento das metas. “Inércia favorável, expectativas ancoradas e elevada capacidade ociosa da economia seguem exercendo pressões baixistas na inflação”, resumiu a economista Julia Passabom, do Itaú Unibanco, em relatório sobre o resultado do IPCA de outubro.
Com um IPCA tranquilo, o BC tem espaço para promover mais cortes dos juros, devendo mantê-los baixos por um tempo considerável. A grande ociosidade existente permite que a atividade possa acelerar nos próximos trimestres sem pressionar a inflação - a aposta da maior parte dos economistas é de que o PIB cresça em torno de 1% neste ano e 2% ou um pouco mais no ano que vem, sem que isso exija elevações dos juros básicos em 2020.
O consenso de mercado é de que a Selic, hoje em 5% ao ano, terminará 2019 em 4,5% e cairá mais 0,25 ponto percentual em 2020, encerrando o ano que vem em 4,25%. Há quem ainda veja um corte adicional de 0,25 ponto, o que levaria a taxa para 4%. Com isso, o juro real (descontada a inflação) ficaria perto de zero.
Nas últimas semanas, a alta das cotações de proteínas no atacado pressionou um pouco os preços ao consumidor, mas a tendência não é preocupante, segundo analistas.