Cliente terá um limite de R$ 500 isento de tarifa
Por Estevão Taiar, Mariana Ribeiro e Talita Moreira — De Brasília e de São Paulo 28/11/2019
O Conselho Monetário Nacional (CMN) alterou as regras para o cheque especial com o intuito de baratear a modalidade. Os bancos poderão cobrar tarifa mensal dos clientes que quiserem ter acesso a um limite emergencial, como vinham defendendo. No entanto, não poderão cobrar taxa de juros de mais de 8% ao mês de quem acessar essa linha de crédito, o que não era esperado. O cliente do banco só terá cheque especial se solicitar ao banco. Nesse caso, terá um limite de R$ 500 isento de tarifa. Caso opte por um colchão maior, o correntista pagará tarifa equivalente a 0,25% do valor que exceder esse limite padrão.
Por exemplo, se o cliente quiser ter um limite de R$ 2 mil no cheque especial, pagará tarifa mensal de 0,25% sobre os R$ 1,5 mil que excederem os R$ 500 isentos. Ou seja, vai pagar ao banco R$ 3,75 por mês, usando ou não esse limite, para tê-lo à disposição. Nos meses em que usar o cheque especial, vai pagar à instituição financeira os juros correspondentes ao montante utilizado menos o valor da tarifa. O teto para os juros começa a valer em 6 de janeiro de 2020, e vale também para contratos antigos. Já a cobrança de tarifas só vale a partir de 1º de junho de 2020.
A medida, anunciada ontem à noite, ainda está sendo digerida pelos bancos. No entanto, pelo menos numa leitura preliminar, despertou “sentimentos mistos” nas instituições financeiras. A cobrança de tarifa, embora defendida pelos bancos, não veio no formato esperado. Mas a limitação das taxas de juros em 8% ao mês não era esperada e repercutiu negativamente.
Uma fonte considera o teto de 8% alto o suficiente para acomodar até um eventual aumento da Selic e diz que a tarifa deve cobrir a rentabilidade necessária do produto. “O cliente fica tipicamente pouco tempo. Então esse teto, embora não seja o melhor dos mundos para os bancos, não compromete a rentabilidade da linha”, disse.
O Valor noticiou no dia 12 que o BC discutia a possibilidade de permitir que as instituições financeiras cobrassem tarifas dos clientes que quisessem ter o cheque especial, para assim conseguirem reduzir as taxas de juros, que estão em média na casa de 12% ao mês. Porém, segundo fonte do setor, a expectativa era que fosse permitida uma tarifa um pouco maior que o 0,25% anunciado e que abrangesse todos os clientes que optassem pelo produto. O formato adotado pelo CMN isenta de cobrança boa parte dos clientes, já que limites de até R$ 500 ficam de fora. De acordo com o BC, hoje existem 19 milhões de pessoas que estariam livres da tarifa mensal. Ao todo, o cheque especial está disponível para 80 milhões de clientes no país.
O cheque especial é a modalidade de crédito mais cara do país, com taxa 305,9% ao ano em outubro. A nova regra reduzirá esse patamar para cerca de 151% ao ano. A Selic está em 5% anuais. Com as mudanças, o BC pretende limitar o uso da modalidade pelos clientes e evitar que os bancos cobrem juros elevados demais. “Tivemos inúmeras reuniões com bancos, mas essa é uma decisão do BC, regulatória”, afirmou o diretor de regulação do Banco Central, Otávio Damaso.
O diretor de organização do sistema financeiro e resolução do BC, João Manoel Pinho de Mello, disse que as mudanças são resultado de um estudo “amplo e rigoroso” feito pelo órgão regulador sobre a modalidade. “Há um custo incorrido sobre o sistema todo por causa desse limite não usado”, disse.
Em paralelo às medidas referentes ao cheque especial, o CMN anunciou medidas para facilitar a portabilidade de crédito e estimular a competição. O objetivo é permitir a transferência de dívidas para modalidades mais baratas.
As operações com cheque especial poderão ser objeto de portabilidade, o que hoje não é possível. Ao mesmo tempo, financiamentos imobiliários contratados no Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) poderão ser enquadradas no Sistema Financeiro da Habitação (SFH) - aquelas em que o cliente pode usar os recursos de sua conta no FGTS para pagar o imóvel.
Também foi criado o Documento Descritivo de Crédito (DDC), que será fornecido pelas instituições com as informações solicitadas pelo devedor referentes à operação de crédito contratada. A norma prevê ainda a possibilidade de ressarcimento pelo custo de originação da operação de crédito objeto da portabilidade, que não poderá ser repassado ao devedor. As mudanças entram em vigor em abril de 2020.
Embora as medidas referentes ao cheque especial não tenham vindo exatamente como os bancos gostariam, o BC atendeu a um pleito deles. As letras imobiliárias garantidas (LIG) agora poderão ser emitidas no exterior, o que deverá ampliar o interesse pelos papéis. Até agora, as captações só podiam ser feitas no mercado local. O Valor informou em junho que o governo preparava essa mudança. A ideia é atrair estrangeiros para esses títulos, que são garantidos por uma carteira imobiliária, e fomentá-los como fonte de recursos para a habitação.
O CMN aprovou ainda novas regras para a contribuição adicional dos bancos ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que passará a ser feita de forma progressiva.
Procuradas, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e as grandes instituições financeiras não comentaram as novas regras até o fechamento desta edição. (Colaborou Flávia Furlan, de São Paulo)